História de uma Papoila I



Até àquele dia, Papoila nunca fora "fiel" ao seu nome, como uma flor de pétalas frágeis e fugidias, a baloiçar ao ritmo do vento e a espalhar as suas sementes pelos campos perdidos e vales escorregadios.
As suas lentes eram dois olhos negros, firmes e atentos com os quais via o Mundo à sua peculiar interpretação.
Olhava-se ao espelho e era incapaz de reconhecer em si mesma um rasgo de paixão cujas papoilas habitualmente emanham com o seu encarnado garrido e exuberante. Em contrário, esta rapariga tinha uma discrição e organização quase irrepreensíveis.
Estas características da Papoila eram consequência da vida que sempre tivera, protegida de ventos inesperados, fortes e perigosos.
Tudo o que tinha era uma vida plana e reta. Para ela, a caminhada seria sempre desta forma: uma estrada sem relevos (altos e baixos), sempre comprida e como tal bastava dar alguns passos em frente e percorrê-la.
Vivia sem grandes paixões.
Sentiu claro, as naturais e típicas atracções adolescentes, mas foram sempre encaradas com uma grande tranquilidade, um olhar realista e não romanceado, quase estranho para a sua idade, mas que lhe permitia ter uma grande distância de tudo o que podia fazê-la sofrer, pela falta de apego a estes fraquinhos passageiros e aborrecidos.
Agradavam-lhes os traços que a faziam sentir-se uma papoila a crescer na estufa com o Sol, a terra, a água ideais; sem excessos trazidos pela chuva ou por um clima menos agradável.
Papoila criara uma capa que a protegia, mas que também a afastava das pessoas e da loucura de sonhar.
À medida que se deixava acariciar mais por ela própria, aninhar-se na sua confortável maneira de ser tão certa e segura, fugia do Mundo para o seu, o que a distanciava agora dos outros, mas também de si.

(to be continued)

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