Tempos de olhar o tempo

   

Neste período que vivemos, tão inesperado, repentino e que veio dar uma reviravolta a todas as nossas vidas, tenho pensado muito numa das mais importantes dimensões da nossa vida: o tempo. 


A nossa vida de uma forma geral, é uma verdadeira corrida contra o tempo, mas ao mesmo tempo, uma falsa ideia de tempo futuro. 

Um tempo que vem depois, algures no futuro, e que magicamente nos vai permitir visitar familiares, estar com quem gostamos, aquele jantar com as amigas de sempre que já adiámos algumas vezes, aquela saída romântica que ainda não fizemos, aquele dia de passeio, um almoço de família em nossa casa, uns dias para brincar com os sobrinhos, entre tantas outras coisas que esta situação de isolamento veio pôr em perspetiva. 

Na correria da rotina das nossas vidas, deixamo-nos embalar nos movimentos repetitivos, na ansiedade de terminar tarefas, até numa sensação de urgência irracional, e acabamos por viver como se aquilo fosse o mais importante da nossa vida.  

 E quando a vida nos troca as voltas, e nos dá tempo para refletir, mas nos tira a possibilidade de estarmos com quem gostamos, somos obrigados a pôr tudo em perspetiva. 

Primeiro, chega uma sensação de ansiedade, como se não soubéssemos o que fazer com o tempo. 

 E depois, começamos a lembrar-nos de todos os momentos da nossa vida que fomos adiando para um tempo imaginário, situado algures no futuro. 

E nesse momento sabemos, que aquilo sim, era o mais importante. 
 
E nesse momento sentimos saudade, das pessoas que gostamos, mas também da vida que deixámos para um tempo que não sabíamos se íamos ter. 


Sem pensar na dificuldade de estarmos fisicamente com aqueles que amamos, de podermos trocar afetos; há um sentir geral que não se atreve a pensar em divergências. De repente algo de tão inesperado veio lembrar-nos como somos pequeninos, como tudo é relativo, como somos todos humanos e vulneráveis. 

Esta reviravolta que nos obriga a olhar o tempo bem de frente, a senti-lo de forma mais profunda, a reavaliar as prioridades da nossa vida e a pôr tudo em perspetiva é de uma grande importância. 

Tantas vezes desejamos ter tempo e agora que o temos nas mãos, sentimo-nos desconcertados, bloqueados, com a necessidade de imprimir rotinas à vida, de preencher cada segundo livre com qualquer coisa desde-aquele-treino-online-que-é-grátis, ao webinar-xpto ou mesmo aos milhares de diretos que invadem as redes sociais. 

Vale a pena pensar no significado deste novo sentir, e tentar chegar ao cerne da questão: 
Desde quando se tornou tão difícil passar tempo connosco próprios? Desde quando é tão difícil parar e escutar apenas o silêncio dos nossos pensamentos? 


Talvez as respostas a estas perguntas nos levem para novas direções e sejam parte da resposta sobre como podemos sair deste período como pessoas melhores, mais felizes, mais equilibradas e com mais tempo para nós e para quem é tão importante.